domingo, 16 de dezembro de 2012

III Carta de Iaponica insula rosarum

Tenho febre.
Escrevo-te acometido de algum mal.
Algumas feridas que restavam do naufrágio parecem não formar cicatrizes.
São estranhos rasgos sobre minha pele que recordam à minha carne a todo momento que há sal, que há sol, que há dias não converso com você e esqueço-me das palavras dos homens.
Não desejo esquecer-me de mim.
Não desejo me perder do pouco que me resta sob estas roupas que em nada mais se parecem com roupas, sob esta pele que em nada mais se parece com quem fui.

[...]

Insistentemente a noiva do mar permanece em pé, de costas para mim, em silêncio, olhando para o horizonte enganoso que se vê em um mundo curioso e redondo.
Ela aguarda.
Ela o aguarda.
O encontro acontecerá inevitavelmente.
No espaço de poucos passos, separam-se universos que se complementam de forma perfeita.
Algo em seus ombros não permitem uma fuga em alta velocidade.
Ela precisa esperar.
Pacientemente como quem domina o ir e vir, ela aguarda para sempre, ali, casar-se com o mar.

[...]

Foi um sonho estranho, Davy.
Tenho tido sonhos estranhos alguns dias.
Eu a via, o mar a via, e das coisas que conseguia ouvir nada soava melhor que o bater das ondas nas pedras à sua esquerda e o vento desmanchar seus cabelos feitos de sal.
Ela, toda ela, feita de sal.

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