quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Sobre cigarros, álcool e rock and roll

“War, children, it’s just a shot away
I tell you love, sister, it’s just a kiss away.”
(The Rolling Stones)
Três tiros no peito. Causa mortis de um jovem estirado no chão de um sábado à noite na Alameda Santos.

Vingança. Crimes passionais. Jonas, Elias, Carlos, Paulo e André seguiriam seu roteiro. O Trianon estava a apenas alguns passos. Alameda Santos. “Estranha nostalgia”, pensava Carlos consigo e com as lembranças mais que recentes que seus vinte e dois anos lhe permitiam ter. Como poderiam as coisas serem assim? Morrer em plena Alameda Santos com três tiros no peito, por amor?... Não, em silêncio percebia: começara a romantizar. Viu uma amoreira. Deveria ser seu pai.
Sim, a voz de seu pai, homem do interior, sabedor das árvores e das coisas da terra, tentara a vida em São Paulo e se mandara ao fim da vida tentada com a mesma busca: tentar a vida em outro lugar. Carlos, tentar a vida em São Paulo. Foi esse o relampejo em sua mente acompanhado de um trago forte daquele cigarro e um gole mais que ardente de um destilado qualquer (na garrafa, mais barato, pego na gôndola há poucos minutos).
Sentados ao beiral do mirante do MASP, conversando, rindo, vivendo, juvenescendo. Carlos testava em silêncio seus limites. Seus pés estavam livres, suspensos em pleno abismo. O que faltaria? A violência das guitarras em alucinação de distorções soando em seus ouvidos, a bateria furiosa a excitar os seus pulmões em espasmos diafragmáticos e fazendo seus olhos arderem em febre, a revolução incontida em cada grito rascante em microfones pobres, em músicas pobres em desespero sem igual: o vôo final... O vôo final?
Sua avó. Dois comprimidos de Diazepam pra dormir. Centenas de pessoas a ir, a vir pela Avenida, veias abertas das cidades do país. A angústia calada pelo horizonte, universo frio e iluminado por baixo por infindas estrelas elétricas. Seus pés de volta ao beiral, alojados em segurança nos blocos coloridos pelo musgo das jardineiras. O MASP parece que vai rachar ao meio. Um olhar que se perde. Outro trago. Setenta e outros anos. Contara-lhe as mais belas histórias, sua avó. Agora belas, as histórias, por serem contadas por sua avó, não mais por suas personagens, babacas que gritavam para rochas se abrirem ou crianças mal-educadas que temiam o Diabo. O Diabo são três balas no peito na Alameda Santos.
“— Vai com Deus, fio. Tá levando a blusa?” Riu pra chorar. Despediu-se dos amigos. Guardou com cuidado os outros três cigarros em seu bolso para não esmagarem na viagem do ônibus até sua casa, na periferia da grande cidade. Daria-os para sua avó que fumava há mais motivos que ele. Tudo agora se iniciava. Novamente. O álcool desvendava seus últimos mistérios em lágrimas.

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